segunda-feira, 26 de maio de 2008

VERBO OBSCURO

http://www.olhares.com/
(Conjuração do Verbo com Sofia (Zocha)))



Sou extremamente desconfiada de mim então desconfio

das palavras. Desconfio da teia das palavras, dos pontos,

das pinças, desconfio das rinhas que frequenta, a palavra

afunda meu espaçamento, o meu ser tempo, me oculta,

me engedra, me respira, mas, não me compreende nem

eu a compreendo. Devo ser-lhe uma caixa oca, com uma

ressonância louca de estupefação de gritos ancestrais da

minha maturidade, violentada no meu tempo/espaço.

Não bordejo, nem vaquejo, me enredo entre sinais que

contesto. Se é habitação me descuido em habita-la, se me

resvala, caio na sua vala, afundo na rala. Desconfio da

palavra, me recuso a entende-la, tento verga-la como o

junco, quebra-la como o cinzel, bebe-la do tonel do cálice

das minhas sangrias, mas, me asfixia, me endemonia, me

lanha, me verte e não me submete, não lhe faço rogo, não

me penitencia, não lhe considero verso puro, fico sempre

atrás dela, desconfiadamente, com meu olho aberto no

escuro, sangrando o meu verbo oculto...

sábado, 17 de maio de 2008

A SALGA

http://www.sapo.pt/




(líricas de um evangelho insano)



O lodo dos pântanos respira e me salga por dentro.

Sob a escuridão, vozes do sertão...

olhai meus lírios de sangue!!!

terça-feira, 13 de maio de 2008

UM GOGÓLICO DESTEMPO COM ZAVADSKI

http://www.thousands.com/




"executo meus versos na flauta das minhas vértebras..."

Maiakóviski





Ele era destempo, destemperado e gogólico,

empunhava a batuta, era pesado, monódico,

pisava firme, afundava o chão e parecia um

engolidor de almas. Ele era um destempo

impróprio à carnaduras, chegava sempre pelo

longo corredor da caverna e por aquela goela

de turbilhonante ansiedade dizia: - A profanação

retempera os desejos, recompõe heresias, é

preciso reconfrontar texturas, libertar-se do

caminho original, do caminho paternal, os animais

nas passagens quebram as bilhas na busca pela

água e comida. Na opressão da caminhada, no

pastoreio, rompem volteios, fogem de velhos

comboios que encontram ao acaso nas estradas,

escapam das similares prosas do mundo. Puxa

a corda umbilical do pião - completava, fugaz

é o gozo da humana condição. E, arrematava

a prosa sem leilão: - O homem é um forjador

de linguagens e no remoinho da história o

lugar é de combates. Avante animais, para

o abate! No fundo, talvez, o verbo, esse sôpro

de ruídos profanadores seja, apenas, um tempo

de incompletudes, do grunhido das coisas, um

tempo de recrias, da palavra sempre grávida

e do animal grávido, alquímica forragem!...

segunda-feira, 12 de maio de 2008

ENTRE CORRENTES UMA ELEGIA PARA NIKOLAO

WWW.SINSIWA.ORG



Meio longe ou meio perto só uma mancha imensa
na retina de borra da tela esmaecida. Não sei se
passo perto ou passo longe, se fico em cima ou se
fico embaixo, se o banco é alto, então, minha visão
é abaixo da linha do horizonte, mas a grande bacia
da água é muito grande, uma imensa cratera e gira
o meu olhar como em decanto, não consigo segura-lo
e a figura daquele homem como uma grande estátua
me horroriza. Como dificuldade olho a grande mesa,
há leite, pão feito em casa, canecas esmaltadas, mas,
não consigo ve-la...não a vejo, os pés de madeira bruta
sobem aos céus como grandes colunas. Me agarro com
dificuldade neles e consigo subir com dificuldade sobre o
banco. Aquele homem ao longe tem uma barba muito
longa, como uma velha árvore tombada permanece
naquela posição imóvel. Os circunstantes arrastam seus
enormes pés...ouço-lhes as correntes, há como é
terrível ouvior os sons de correntes, correntes que
degolam, assim o matadouro próximo daqui tá
fazendo agora, correntes que se usam em pescoços
com santinhos, correntes que em cadarços amarram
sapatos, que afundam pregos em sua sola...há o solado
dos sapatos e o velho sapateiro Lucidório que mora
no bairro Jardim Paulista, há alguns quilometros daqui
do escritório...com seus sapatos consertados, congelados
naquelas prateleiras com cheiro de cola, tinta e fungo de
pés... os pés que são suportes e arrastam correntes...mas,
a barba enorme daquele homem sentado continua
fustigando o meu olhar como uma imensa mancha
que o tempo, nem as águas das chuvas não conseguem
diluir...sua barba é uma enorme corrente serpenteando
as dobras do instante. E eu, não consigo segurar o instante,
a palavra foge, se esfuma, apenas a ouço e já a vejo
despregar-se no tempo, mas, a grande mancha se
reconfigura na tela e revejo com claridade atrás da
palavra o velho alemão, Nikolao, meu avô, com suas
longas barbas, os pés dentro da bacia de água cheia
de sangue e uma ferida profundamente escavada
sangrando-lhe intermitentemente de uma das
colunas de suas pernas...No vazio do espaço a
formatação das linhas das águas que se esvaem,
a barulheira na farmácia aqui ao lado, o cinza
recaído sobre o gramado da manhã, as correntes
se arrastando e se despetalando no mesmo ritmo,
tudo sempre se esfumaça, se rasga, sine die...

sábado, 10 de maio de 2008

VERBO SONORO TE AMO

WWW.THOUSANDS.COM
"...atrás do pensamento não há palavras. É-se".

(Clarice Lispector)




VERBO SONORO TE AMO

PARA MINHA MÃE DONA HILDA

PELA GRANDEZA DE SUA FORÇA,


DE SUA SIMPLICIDADE

PELA TERNURA DE SUA VOZ (ELA CANTAVA)!

quinta-feira, 8 de maio de 2008

INCANDESCENTE



"...executo meus versos na flauta das minhas

das minhas vertebras..."

(Maikóviski)




A taça de espumas seca o signo.

A matéria mágica dos sonhos

se molda ao pensamento.

Meus dedos cegos de luz

se alimentam e moldam a argila

e o peso do teu breu molda

minha alma incandescente

Desde sempre moldam-se

os golpes da adaga,desde sempre

as margens e as cabeceiras das águas

são moldadas,desde sempre a talha

nos costados selvagens molda a boca,

a língua do vento que derrete o tempo,

da agulha que cose a pedra

e lancina a toda boca devorada!