(Reverberas de Sofia (zocha)/Carroção do
Tempo (dos polacos))
Tantos eram os portões de ripas, com suas taramelas
por dentro, de folhas sopradas nas casas do tempo...
tantos são os fantasmas noturnos que esvoaçam
entre as frestas daquelas cercas de pinho araucária
e açoitam aqueles portões e seguram os olhos,
que ressurgem ,assim, esses esquadros das pulsações da alma,
por entre os morcegos que vagueiam pelos beirais
e reviram as sombras entre os avessos dos chafurdados
porões, entre as réstias dos alhos!...
O céu degela , a vida recomeça.
Comadre Emília não pode mais ultrapassar os portões
de sua casa. Aprisionou-se, tem agora os olhos escavados
nas fundas grutas do rosto, encravaram-se na sepultura
do finado filho Paulinho o já sorriso tímido e os crivos das
das palavras. Nunca mais pisará o pé fora de casa, além
do portão frágil das cercanias de ripas em lanças. Ficará
como sua casa, encravada, circunscrita
entre os arvoredos, entre os beija flores e os morcegos,
entre cravos, flores de cera, begônias e avencas, com a
alma dependurada pelos fios das teias de arame que
seguram os vasos-latas na pequena varanda
e só chegará ao portão e contemplará o mundo
conversando por sinais e grunhidos, com a
polaca Nuska do outro lado da rua e os passantes
que a reconhecerem e ela pensar reconhecer...
A filha Odete acabará por ficar noiva de João,
terá quatro filhos, todos sairão à cara arretada do marido,
construirá uma casa nos fundos, ficará porta à porta com a mãe,
indefinidamente...
entre elas não haverá mais portões,
viverá numa singela casa mobiliada de móveis
de pinho, paneleiro de alúminio,
jogo de cozinha azul com caixão de lenha....e um dia não
muito distante enterrará um dos filhos ainda não nascido.
Os portões parecem alinhavar linhas demarcatórias, bastidores de riscados,
de indefinidas malhas geográficas, afivelar cercanias do pensamento
sob a película da concavidade do tempo,
e armam suas teias, erguem suas colunas,
e enfileiram-se como sentinelas, pensam anteceder
grunhidos, sons,
guardar casas, uns de olhos de ripas, outros, de ferro,
outros e outros de ferrolhos de alúminio, de aço!
Ontem, as últimas chuvas descamaram, descascalharam
a rua Alagoas. Grandes valas se abriram, se descarnaram
da terra com perigosas fendas para o trânsito além dos portões.
Odete continuará trabalhando na fábrica da Linhagem, há
alguns quilometros de casa, indo e vindo com a bicicleta
Axel, beirando a linha do trem perto da Usina de óleo coméstivel
Fanadol e subindo a rampa sulcada pelo degelo das enxurradas,
nas manhãs fechadas da gelada Curitiba. Assim, abrirará e
fechará todos os dias a taramelas do portão de ripas. Não esquecerá
de levar o cachecol de lã tricotado em ponto meia, enrolado em
volta do pescoço e da marmita de alumínio, na sacola de pano,
no porta-bagagem!...
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